"Como contar o que se seguiu? Eu estava estonteada, e assim recebi o livro na mão. Acho que eu não disse nada. Peguei o livro. Não, não saí pulando como sempre. Saí andando bem devagar. Sei que segurava o livro grosso com as duas mãos, comprimindo-o contra o peito. Quanto tempo levei até chegar em casa, também pouco importa. Meu peito estava quente, meu coração pensativo.
Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre ia ser clandestina para mim. Parece que eu já pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar... Havia orgulho e pudorem mim. Eu era uma rainha delicada.
Às vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo.
Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante."
Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre ia ser clandestina para mim. Parece que eu já pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar... Havia orgulho e pudor
Às vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo.
Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante."
Trecho do conto "Felicidade Clandestina" de Clarice Lispector
É assim que me sinto quando pego um livro pra ler...extasiada!
(Vale a pena ler esse conto da Clarice! é um dos que eu mais gosto!)
"Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre ia ser clandestina para mim."
ResponderExcluirEu também faço isso que ela descreve! Às vezes fico olhando o livro, sem ler, fazendo rodeios, meio que adiando o momento!
E esse final é maravilhoso, incrível.
"Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter."
ResponderExcluirGenteeee, muitoo perfeito isso! Acho que todas nós aqui temos esse sentimento em relação ao livro. Muitas vezes, eu compro livros e fico admirando a capa, abrindo, fechando, lendo alguns trechos... Exatamente dessa forma: "êxtase puríssimo" Haha!
"Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante."
ResponderExcluirGente, que coisa linda!
Pois é, eu também fico rodeando, olhando a capa, lendo tudo o que tem no livro que não é a história antes de começar. Como que para conhecer o desconhecido...mas a cada linha descubro que não sei nada... É puro êxtase :)
Maravilhoso!Também sinto o livro quase como um amante: algo misterioso, divertido, libertador!!
ResponderExcluirE o cheiro?Ahhhh,adoro cheiro de livro novo!
ResponderExcluir