sexta-feira, 30 de abril de 2010

Destino


"Não sou a areia
onde se desenha um par de asas
sou grades diante de uma janela.
Não sou apenas a pedra que rola
nas marés do mundo,
em cada praia renascendo outra.
Sou a orelha encostada na concha da vida,
sou construção e desmoronamento,
servo e senhor,
e sou mistério
A quatro mãos escrevemos este roteiro
para o palco de meu tempo:o meu destino e eu.
Nem sempre estamos afinados,
nem sempre nos levamos a sério"
Lya Luft

Meu existir é vítima de uma fatalidade




"Eu quero mostrar a mim mesma o mais sujo e mais baixo de mim — e aí eu só então me perdoar. Quero que me perdoem eu ser tão cheia de sensualidade que é um grito animal dentro de mim, um gosto de voz aguda de lobo desejando a presa, eu! eu que aspiro à grande desordem dos desejos vis e as trevas que me possuem no orgasmo apocalíptico de meu existir. Meu existir é vítima de uma fatalidade. Isto é: eu sou, oh coitada de mim humana e fraca e carente e pedinte e esmoler. Quero o teu sorriso, quero o teu afago de veludo, quero a luta corpo a corpo, tão íntimos os dois, tão crianças ingênuas e perdidas.Eu clamo pela absolvição! Oh Deus poderoso, me perdoe a minha vida errada e de péssimos hábitos de sentir, me perdoe em existir em gozo tão luxuriante e sensual da absorção dos miasmas do corpo a corpo. Quero abismo para ti e receber-te como uma rainha de Sabá."

Trechos de Um sopro de vida. Clarice Lispector.

Abandonando os confins brasileiros...


Olá, minhas queridíssimas literatas!

Chegamos a mais uma sexta-feira e, conseqüentemente, a mais uma edição do nosso "Eu indico...". Anteriormente, nos deleitamos com Vozes inesquecíveis da música brasileira , que vocês ainda podem conferir num clique. No entanto, nossa seleção de hoje passa bem longe das terras tupiniquins... estamos Abandonando os confins brasileiros, por enquanto.

Confesso que minha paixão por outras línguas e culturas foram as grandes guias da temática que vamos abordar. O que, por ora, me fez enveredar por uma espécie de pesquisa a respeito do que os outros cidadãos deste mundo guardam em seus Ipod e similares. Comecei, primeiramente, buscando em meus próprios arquivos, vendo o que eu ouvia que não fosse dos nossos compositores. Encontrei algumas canções bem interessantes - que não querem dizer, necessariamente, desconhecidas - contudo, não era o bastante. Iniciei, então, minha grande busca pelas páginas do Google e, acreditem, a gente pode encontrar muita coisa boa por lá.

Resolvi encerrar minha navegação por essas páginas todas quando encontrei o último componente desta seleção, mas realmente dá vontade de continuar procurando muitas e outras músicas. De qualquer forma, me deparei com representantes de tantos países... Bélgica, Suíça, Suécia, Alemanha, Austrália... países que eu nunca havia me perguntando a respeito de sua produção musical. Então, minha tarefa esta semana é a de mostrar um pouco do que achei por aí e esperar que vocês façam por aí suas descobertas e depois compartilhem também.

Ah, antes de falarmos da nossa sétima posição, aqui vão algumas das minhas descobertas, que espero que vocês apreciem. Uma delas foi um cantor belga, chamado Stromae, que é bastante popular na França. E por quê? Confiram sua canção Alors on Dance aqui. Outra foi uma cantora sueca, Anna Bergendahl; confiram sua apresentação aqui. Agora, vamos a nossa sétima posição!

Participando do festival Eurovision, assim como Anna Bergendahl, nossa sétima colocada representa seu país, a Alemanha, com uma de suas composições. Com apenas dezoito anos, já destaca-se no cenário musical e tem bastante chances de ser um nome reconhecido por aí. Mas, convenhamos, será que dá pra conhecer tudo o que se escuta do outro lado do mundo? Não fossem uns cliques aleatórios, talvez eu ainda não pudesse saber de sua existência. Daí um título alternativo para a temática de hoje: Será que existe música do outro lado? Apreciem então, a canção Satellites, de Lena Meyer-Landrut.



Diretamente de Londres, nossa sexta posição é bastante comparada a outras de suas conterrâneas. Embora não seja bastante conhecida em nossas terras, acredito que ela seja uma boa pedida em nossas playlists em qualquer dia da semana ou qualquer hora do dia. Suas canções são uma delícia de ouvir, pois têm um tom sempre bem divertido - tanto nas letras quanto na própria melodia. São contagiantes! Aliás, acredito que o vídeo possa dizer exatamente o que estou tentando lhes explicar. Com vocês, Kate Nash e sua canção Pumpkin Soup.



Logo ao lado da terra da rainha, temos a Irlanda, que é de onde vem o nosso quinto lugar. Ao contrário das nossas posições anteriores, este é um grupo bastante conhecido, e, especialmente nos anos 1990', muitas de suas canções tocavam incessantemente nas rádios de todo o mundo.
Este grupo possui aspectos bastante curiosos, como o fato de agregarem em sua produção musical alguns aspectos da cultura celta, além de sua formação ser mantida em família - são três irmãs e um irmão. Ofereço a vocês uma de minhas canções preferidas, de um dos meus grupos musicais preferidos, Summer Sunshine, do The Corrs.


Vamos atravessar o oceano e retornar à América. Em nossa quarta posição, temos uma intérprete que também é compositora, atriz e produtora. Já vendeu quase oitenta milhões de álbuns pelo mundo afora, e tem uma das melhores vozes que já ouvi. Por ser outra de minhas preferidas, foi bem difícil escolher somente uma música. Suas canções têm sempre um quê de reflexão - seja sobre o amor, sobre a vida, ou sobre você mesmo. Inevitável ouvi-la, sempre. Com vocês, Alanis Morrissette e a música Head over feet.


Em nossa terceira posição, com a medalha de bronze, temos um grupo escocês dos anos 1990' que, à primeira vista, me pareceu uma dupla ao invés de uma banda. Isso, simplesmente, pelo nome. Mas depois que comecei a ouvi-los, esta idéia se esvaiu em segundos. Essa banda indie é bem alternativa, mas tem um som bem gostoso. Vale a pena conferir. Então, aproveitem Belle & Sebastian com Blues are still blue.


Já a nossa segunda posição vem dos Estados Unidos e não é nenhuma das divas da música pop, tampouco um grupo de rock 'n' roll. Ela interpreta canções de jazz, algumas até mesmo em língua francesa. Sua voz é uma delícia, perfeita para acompanhar os momentos em que uma taça de vinho e um excelente livro são as melhores companhias. E, claro, namorando também. Aliás, ela fará turnê nas terras tupiniquins este ano! E se apresentará em Brasília no dia doze de junho. Quem puder prestigiá-la, eu recomendo. Bom, sem mais delongas, Madeleine Peyroux e sua canção Don't wait too long.



Por fim, para nossa primeira posição, lhes trouxe alguém da terra dell'amore, a Itália. Este é um dos meus cantores favoritos de lá, inclusive, o primeiro com quem me simpatizei. Ele é intérprete, compositor e também escritor. Sendo italiano, portanto, não há muito o que dizer, já que sabemos o quanto esta língua é sedutora e envolvente. Então, me despeço de vocês ao som de Luciano Ligabue, com Un colpo all'anima.


Então é isso, minhas queridas, espero que tenham gostado da seleção de hoje.
Até a próxima.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Here, There and Everywhere

To lead a better life,
I need my love to be here...

Here, making each day of the year
Changing my life with a wave of her hand
Nobody can deny that there's something there

There, running my hands through her hair
Both of us thinking how good it can be
Someone is speaking but she doesn't know he's there

I want her everywhere
and if she's beside me I know I need never care.
But to love her is to need her

Everywhere, knowing that love is to share
each one believing that love never dies
watching her eyes and hoping I'm always there
(...)
I will be there, and everywhere
Here, there and everywhere

(Trechos de Here, There and Everywhere - The Beatles)

Essa é uma das minhas músicas preferidas. Tem uma melodia encantadora. Assim como Yesterday, foi regravada por muitos outros cantores também. Uma curiosidade, pra quem acompaha ou acompanhava a série Friends, é que essa foi a música que tocou no casamento da Phoebe, em versão instrumental. Quem quiser ver ou relembrar a cena, é só clicar aqui.

Devagarinho


BILHETE

"Se tu me amas, ama-me baixinho
Não o grites de cima dos telhados
Deixa em paz os passarinhos
Deixa em paz a mim!
Se me queres,
enfim,
tem de ser bem devagarinho, Amada,
que a vida é breve, e o amor mais breve ainda..."
Mário Quintana

quarta-feira, 28 de abril de 2010

O mistério da poesia

Há na arte, como nas coisas, uma margem de inexplicável. Certas imagens poéticas são a parte do inexplicável, a brusca invasão do mistério no campo do racional. A nossa resposta depende, naturalmente, do sentimento que tivermos dessa parte irredutível do espírito e do mundo, que cerca de todos os lados a nossa pequena ilha de razão e clareza. Devemos, creio eu, aceitar esse tipo de obscuridade, pois ela é uma das maneiras por que se afirma a consciência artística – criando o mistério à imagem do próprio mistério e dando ao artista uma força de penetração além da visão comum.
A atitude assumida por nós diante do hermetismo depende da educação do gosto e da nossa compreensão do fenômeno artístico. Se atentarmos para o fato de que a obscuridade se torna, a mais das vezes, opaca e indevassável devido apenas à nossa falta de simpatia poética; se nos lembrarmos, sobretudo, que a seu tempo todos os grandes criadores de poesia (hoje considerados cristalinos) foram acusados de incompreensíveis – nos convenceremos que nós é que devemos chegar até a poesia, e não esperar que ela chegue até nós, como um refresco que nos trazem para bebermos sem esforço, comodamente sentados.
Em poesia, a incompreensão é devida em parte ao fato de não haver unidade nem sincronia no espírito do leitor. Nos nossos dias, a maioria dos leitores ainda tem a sensibilidade encalhada na fase parnasiana. (...) É uma fatalidade irremediável. Um tipo de poesia só penetra a média dos leitores quando já vai deixando de ser nova e cedendo lugar a um tipo mais adiantado. Circunstância que nos deve convidar à modéstia e, antes de renegar um poema (“futurista idiota!”), nos fazer lembrar de que as nossas avós acharam Bilac totalmente ilegível e não hesitaram em jogar fora qualquer livro de Alphonsus de Guimaraens. Habitualmente lemos para não fazer esforço e gostamos de encontrar o que já esperávamos. Daí a irritação que nos toma ao encontrarmos uma novidade atrevida no meio da nossa rotina. E daí a necessidade que têm os inovadores de acentuar, carregar as tintas e contundir com certa violência a inércia do nosso comodismo estético.


Extraído de "Notas de crítica literária - duas notas sobre poética", de Antonio Candido.

P.S.: um post bem "nerds" para gente relembrar as aulas da Ana Laura e do Hermenegildo :)

Janela


"Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, coisas que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim"

Cecília Meireles

Entre um blues amargo e um poema de vanguarda...


"
...Mas só muito mais tarde, como um estranho flash-back premonitório, no meio duma noite de possessões incompreensíveis, procurando sem achar uma peça de Charlie Parker pela casa repleta de feitiços ineficientes, recomporia passo a passo aquela véspera de São João em que tinha sido permitido tê-lo inteiramente entre um blues amargo e um poema de vanguarda. Ou um doce blues iluminado e um soneto antigo. De qualquer forma, poderia tê-lo amado muito. E amar muito, quando é permitido, deveria modificar uma vida – reconheceu, compenetrado. Como uma ideologia, como uma geografia: palmilhar cada vez mais fundo todos os milímetros de outro corpo, e no território conquistado hastear uma bandeira. Como quando, olhando para baixo, a deusa se compadece e verte uma fugidia gota do néctar de sua ânfora sobre nossas cabeças. Mesmo que depois venha o tempo do sal, não do mel..."

Caio Fernando Abreu

terça-feira, 27 de abril de 2010

Era Ana

"Era Ana, era Ana, Pedro, era Ana a minha fome" explodi de repente num momento alto, expelindo num só jato violento meu carnegão maduro e pestilento, "era Ana a minha enfermidade, ela a minha loucura, ela o meu respiro, a minha lâmina, meu arrepio, meu sopro, o assédio impertinente dos meus testículos" gritei de boca escancarada, expondo a textura da minha língua exuberante, indiferente ao guardião escondido entre os meus dentes, espargindo coágulos de sangue, liberando a palavra de nojo trancada sempre em silêncio, "era eu o irmão acometido, eu, o irmão exasperado, eu, o irmão de cheiro virulento, eu, que tinha na pele a gosma de tantas lesmas, a baba derramada do demo, e ácaros nos meus poros, e confusas formigas nas minhas axilas, e profusas drosófilas festejando meu corpo imundo; (...)"

Trecho de Lavoura Arcaica, de Raduan Nassar.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Bem devagar

Oi, meninas! Quero compartilhar uma bela canção do Gilberto Gil, que vocês podem ouvir na voz de Caetano Veloso aqui.

Sem correr
Bem devagar
A felicidade voltou para mim
Sem perceber
Sem suspeitar
O meu coração deixou você surgir
E como o despertar depois de um sonho mau
Eu vi o amor sorrindo em seu olhar
E a beleza da ternura de sentir você
Chegou sem correr
Bem devagar
Amor velho que se perde
Sai correndo para outro ninho
Amor novo que se ganha
Vem sem pressa, vem mansinho...

domingo, 25 de abril de 2010

O rio do meio


"Há um duelo permanente entre duas personalidades que habitam, talvez, todo mundo:uma, a convencional, que faz tudo direito; a outra, a estranha, agachada no porão da alma ou num sótão penumbroso, que é louca, assustadora; quer rasgar as tábuas da lei, transgredir, voar com as bruxas, romper com o cotidiano. E interfere naquela boazinha, que todos parecem conhecer tão bem"

O rio do meio, Lya Luft.

sábado, 24 de abril de 2010

Absurdamente feliz


"Explodia em riso sem motivo aparente; que amava sua casa e sua família; sonhava entre seus livros ou deitada na grama adivinhava o desenho das nuvens; que embalada na rede cantava invenções suas e queria ser absurdamente feliz."

O Rio do Meio, Lya Luft.

Vamos incrementar nosso clube do livro?


Minhas queridas literatas,
Esses dias de ócio me puseram uma idéia na cabeça. E estive conversando com a Gabi a respeito dela, que gentilmente me sugeriu que postasse aqui no nosso blog para que pudéssemos discutir sua viabilidade. Bom, sem mais delongas, eis a minha idéia:

Tendo em vista que alguns dos melhores livros que já li - sejam eles melhores por sua capacidade de entretenimento ou de reflexão verdadeira - foram indicados por outros amigos e amigas, pensei o seguinte. O que vocês acham de, na nossa próxima reunião, tentarmos isso: funcionaria similarmente a uma corrente literária. O que isto significa? Significa que nós iríamos nos indicar livros. Por exemplo: Eu li um livro da Cecília Meireles que acho que a Gabi vai gostar muito, então eu empresto pra ela. Por sua vez, Gabi tem um livro que acha que vai interessar muito a Vanessa, e empresta pra ela. E isso pode funcionar de duas formas: ou cada uma só lê a indicação da outra amiga, ou os livros (não sei quantos ao todo, mas devem ser uns seis, por aí) circulam entre todas nós (por um tempo bem maior que um mês, obviamente). Pode até acontecer uma reunião especial, onde falaríamos das impressões de cada livro que cada uma emprestou, ou simplesmente, ler por diversão. Assim, conheceríamos mais o gosto uma das outras, o que acham?

Bom, fica minha sugestão pra vocês!
Beijinhos e ótimo final de semana!

Uma nesga de sol, uma cama bem aquecida e um poema dele...


Bom dia, minhas amadas literatas!
Nada como começar este sábado ensolarado e lindo com um poema de Drummond, não acham?!
Eis a minha sugestão de hoje!


Segredo

A poesia é incomunicável.
Fique torto no seu canto.
Não ame.

Ouço dizer que há tiroteio
ao alcance do nosso corpo.
É a revolução?o amor?
Não diga nada.

Tudo é possível, só eu impossível.
O mar transborda de peixes.
Há homens que andam no mar
como se andassem na rua.
Não conte.

Suponha que um anjo de fogo
varresse a face da terra
e os homens sacrificados
pedissem perdão.
Não peça.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

And I found that love was more than just holdin' hands

If I fell in love with you
Would you promise to be true
And help me understand?

'Cause I've been in love before
And I found that love was more
Than just holdin' hands

If I give my heart to you
I must be sure
From the very start
That you
Would love more than her

If I trust in you
Oh, please
Don't run and ride
(...)

'Cause I couldn't stand the pain
And I
Would be sad if our new love
Was in vain

So I hope you see
That I
Would love to love you
(...)

(Trechos da música If I Fell, The Beatles)

Quem quiser conferir a bela intepretação dessa música pela atriz Evan Rachel Wood no filme musical "Across the Universe", é só clicar aqui.

É minha!

"...e as pombas do meu quintal eram livres de voar, partiam para longos passeios mas voltavam sempre, pois não era mais do que amor o que eu tinha e o que eu queria delas, e voavam para bem longe e eu as reconhecia nos telhados das casas mais distantes entre o bando de pombas desafetas que eu acreditava um dia trazer também pro meu quintal imenso"
(p. 98, Lavoura Arcaica, de Raduan Nassar)

O capítulo 17 é sem dúvida o mais belo do livro.

Vozes inesquecíveis da Música Brasileira



Queridas amigas literatas,

Na edição anterior de "Eu indico...", lhes presenteei com ícones da música internacional, figuras polêmicas, irreverentes e marcantes. E, para quem ainda não conferiu, é só visitar nossa temática anterior, Eles fizeram história... e se deliciar com nossa seleção musical. Nesta sexta-feira, nossa seleção não fica por menos... teremos Vozes inesquecíveis da Música Brasileira , que parecem desenhadas para nos embalar com suas letras poéticas... E já lanço a pergunta da semana: de quem é a voz mais marcante da música brasileira para vocês, minhas queridas?

A música brasileira, especialmente a vertente denominada popular - a MPB, possui infindáveis recursos líricos, que são nossos poetas. Eles brincam com a linguagem, com a melodia, com o tom. Nos embriagam com suas composições e nos despertam sentimentos de diversas ordens. Confesso que cometo boa parte dos pecados capitais só de ouvir boa música nacional... e, especialmente, aquele sentimento mesquinho da inveja, onde não consigo parar de me perguntar: "Por que não fui eu quem compus esta canção? É exatamente isto o que eu sinto, desse mesmo jeito!"... Porém, esse sentimento se esvai quase que de imediato, para que eu possa, de fato, contemplar essas palavras que são tão universais, que me aproximam de outras pessoas, que sentem o mesmo que eu.

E, exatamente por este motivo, foi tão difícil escolher nossos representantes de hoje. São tantos nomes, tantas vozes... como escolher apenas sete? Espero, contudo, ter feito boas escolhas! Sejam, então, bem-vindas ao "Eu indico..." de hoje... e vamos à sétima posição!

Nosso sétimo colocado são, na verdade, dois. Me deparei com uma escolha muito complexa: como escolher uma voz brasileira que seja contemporânea, mas que já seja consagrada, inesquecível, inconfundível? Foi quando me lembrei de uma parceria que resume, para mim, este conceito. São duas vozes graves, fortes e suas composições são uma delícia de ouvir. Cantando juntos, então, é até difícil de desligar o som. Com vocês, Ana Carolina & Seu Jorge e a música Chatterton.


Na sexta posição, ele, que compôs letras com críticas ferrenhas a um Brasil recém-saído da ditadura; ele, que enfrentou a Aids e um mundo preconceituoso por sua opção sexual; ele, que fez história com o Barão Vermelho, e, que até hoje me comove com sua singela canção Codinome Beija-flor. Simplesmente, Cazuza.



Em quinto lugar, um dos músicos responsáveis por (e)levar a música brasileira para um outro nível. No final dos anos sessenta, destaca-se como um dos intérpretes da bossa nova, contudo, são suas contribuições musicais as verdadeiras responsáveis pela concretização do que hoje chamamos de Música Popular Brasileira. Com suas composições, como "Alegria, alegria", Caetano Veloso estava à frente do movimento tropicalista, que tornou-se uma maneira bastante original e criativa de driblar a ditadura militar e a censura. Contudo, como romântica incorrigível, a minha escolha não é uma das canções dessa época, e sim, uma das canções mais suaves que ele já interpretou. Com vocês, Você é linda.



Em nossa quarta posição, o cenário é bastante parecido. Estamos na época da ditadura, e as canções de protesto continuam camufladas nas minúcias da linguagem. Ele é músico, dramaturgo e escritor - e eu diria mais, ele é poeta. Com canções como as suas, como não chamá-las de poesia? Minha escolha para hoje é Construção. Aproveitem Chico Buarque.



Em nossa terceira posição, temos também uma das vozes mais fortes dos anos sessenta. Suas performances no palco levaram ao público o melhor da bossa nova, tornando-se única por sua técnica vocal. Era também super engajada politicamente e contestou o governo militar durante os anos de chumbo. Com vocês, Elis Regina e sua consagrada interpretação de Como nossos pais.



Em nosso segundo lugar, a exemplo de Elis Regina, indico a vocês uma das melhores intérpretes que a música popular brasileira já conheceu. Com seu tom rouco, irreverente, masculino, que se sobressai dentre as demais, Cássia Eller transforma tudo o que canta e todos que lhe escutam. Aproveitem O segundo sol.


E, para encerrar a nossa seleção dessa sexta-feira, vamos à nossa primeira posição. Um dos compositores mais importantes de todo o cenário brasileiro, foi vocalista do Aborto Elétrico, mas foi com o grupo musical Legião Urbana que Renato Russo realmente se revelou. Com suas canções de protesto, ele movimentou a juventude dos anos 1980', também recém-saídos da ditadura. Contudo, suas músicas ainda hoje são ecos dos protestos dos jovens dos anos 2000'. Em homenagem ao cinquentenário de nossa cidade linda, Brasília, ofereço a vocês Faroeste Caboclo.


Espero que tenham gostado da seleção de hoje!





“A vida é maravilhosa, mesmo quando dolorida. Eu gostaria que na correria da época atual a gente pudesse se permitir, criar, uma pequena ilha de contemplação, de autocontemplação, de onde se pudesse ver melhor todas as coisas: com mais generosidade, mais otimismo, mais respeito, mais silêncio, mais prazer. Mais senso da própria dignidade, não importando idade, dinheiro, cor, posição, crença. Não importando nada”.

O Ponto Cego, Lya Luft.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

"Ó meio-dia confuso, ó vinte-e-um de abril sinistro..."

Era pra eu ter postado isso aqui ontem, mas acabei esquecendo! Este é o último poema do Romanceiro da Inconfidência, e um dos mais interessantes. Não poderia deixar de colocar algo sobre o meu corpus aqui, hehehe (gurias, já escrevi 6 páginas e meia do meu artigo, viva!)

Fala aos Inconfidentes Mortos

Treva da noite,
lanosa capa
nos ombros curvos
dos altos montes
aglomerados...
Agora, tudo
jaz em silêncio:
amor, inveja,
ódio, inocência,
no imenso tempo
se estão lavando...

Grosso cascalho
da humana vida...
Negros orgulhos,
ingênua audácia,
e fingimentos
e covardias
(e covardias!)
vão dando voltas
no imenso tempo
- a água implacável
do tempo imenso,
rodando soltos,
com sua rude
miséria exposta...

Parada noite,
suspensa em bruma:
não, não se avistam
os fundos leitos...
Mas, no horizonte
do que é memória
da eternidade,
referve o embate
de antigas horas,
de antigos fatos,
de homens antigos.

E aqui ficamos
todos contritos,
a ouvir na névoa
o desconforme,
submerso curso
dessa torrente
do purgatório...

Quais os que tombam,
em crime exaustos,
quais os que sobem,
purificados?

Cecília Meireles.

Oceano infinito


“Gostaria de voar numa vassoura e dançar com outras bruxas pagãs no bosque à luz do luar, invocando as forças da Terra e afugentando demônios, quero converter-me numa velha sábia, aprender antigos encantamentos e segredos de curandeiros. Não é pouco o que eu pretendo. As feiticeiras, tal como os santos, são estrelas solitárias que brilham com luz própria, não dependem de nada nem de ninguém, por isso carecem de medo e de lançar-se cegas no abismo com a certeza de que em vez de se destruírem sairão a voar. Podem converter-se em pássaros para ver o mundo de cima ou vermes para vê-lo por dentro, podem habitar noutras dimensões e viajar para outras galáxias, são navegantes num oceano infinito de consciência e conhecimento.”

Trecho de Paula, de Isabel Allende.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Não: devagar.


Devagar, porque não sei
Onde quero ir.
Há entre mim e os meus passos
Uma divergência instintiva.
Há entre quem sou e estou
Uma diferença de verbo
Que corresponde à realidade.

Álvaro de Campos, Ficções do Interlúdio.

"Espirituosidade insultuosa"

A revista Língua Portuguesa desse mês veio com uma matéria super interessante: O insulto é relativo.



Achei o máximo a lista de insultos improváveis, para aumentar nosso repertório! E melhor ainda é a lista de palavras que parecem insultos, mas não são!

Aí vão alguns:
Apedeuta: ignorante
Ababelado: quem nunca termina o que começa
Acatruzo: chato
Cabrião: chato ao extremo
Esteatopígico: quem tem o traseiro grande
Plesbiofrênico: caduco, que inventa histórias
Janicéfalo: pessoa de duas caras
Súcubo: puxa-saco
Valdevino: oportunista

Parece, mas não é:
Zuruó: divertido
Enxacoco: quem não fala bem uma língua estrangeira
Catecúmeno: novato, funcionário sem experiência

Agora podemos criar frases cheias de pompa usando esses termos! Assim, podemos extravasar sem sermos percebidas! Reflitam: pode ser uma experiência libertadora!

Desmascarando George Clooney

Queridas,
esse é um texto super divertido do Luís Fernando Veríssimo. Ri muito quando li pela primeira vez. De fato, George Clooney é insuperável nos quesitos charme e elegância! Já virou um símbolo de perfeição! Hahaha!


O Verdadeiro George Clooney
(Luís Fernando Veríssimo)

Longe de mim querer difamar alguém, mas acho que no caso do George Clooney o que está em jogo é a autoestima da nossa espécie, os homens que não são George Clooney. Todas as nossas qualidades e todos os nossos atributos, físicos e intelectuais, desaparecem na comparação com o George Clooney. As mulheres não escondem sua adoração pelo George Clooney. O próprio George Clooney nada faz para diminuir a idolatria e nos dar uma chance. Fica cada vez mais adorável, cada vez mais George Clooney. E se aproxima da perfeição. É bonito. É charmoso. É rico. É bom ator. Faz bons filmes. Está envolvido com as melhores causas. E que dentes! Não temos defesa contra esse massacre. Só nos resta a calúnia.
Os dentes são falsos. Ali, onde elas veem pomos da face irresistíveis e um queixo decidido, há, obviamente, botox. Ele tem pernas finas e desvio no septo. É solteiro, portanto, claro, gay. Tem casa num dos lagos italianos, o que já é suspeito, e dizem que anda pelos seus chãos de mármore depois do banho de espuma vestindo um longo caftan bordado e sendo borrifado com perfumes florais pelo seu amante filipino Tongo, enquanto seu amante italiano, Rocco, prepara a salada de rúcula completamente nu. George Clooney bate na mãe todas as quintas-feiras. É extremamente burro. Só leu um livro até hoje e não lembra se foi “O Pequeno Príncipe” ou “O Grande Gatsby”. Nos filmes em que faz personagens mais reflexivos, contratam um dublê para as cenas dele pensando. Foi ele que propôs a demolição da Torre Eiffel porque já era mais que evidente que não encontrariam petróleo no local. E sua sovinice é lendária. Levou nadadeiras quando visitou Veneza, para não gastar com táxi.

É notório, em Hollywood, o mau hálito do George Clooney. Quando ele fala em algum evento público, as primeiras três fileiras do auditório sempre ficam vazias. Atrizes obrigadas a trabalhar com ele têm direito a um adicional por insalubridade, em dobro se houver cenas de beijo. Outra coisa: a asa. Não adiantam as imersões em espuma na sua banheira em forma de cisne, nem os perfumes florais borrifados, o cheiro persiste. Sabem que George Clooney e suas axilas se aproximam a metros de distância, e muita gente aproveita o aviso para fugir.

Além de tudo, tem seborreia e é republicano.

Passe adiante.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Meu amado amigo


"Há fases em que, inquieta, eu talvez aponte mais o lado preocupante da vida. Mas jamais esqueço a importância do bom humor, que na verdade me caracteriza no cotidiano, mais do que a melancolia. Meu amado amigo Erico Verissimo certa vez me disse: "Há momentos em que o humor é até mais importante do que o amor". (Lya Luft)

Eles fizeram história...

Olá, queridas amigas literatas!

Excepcionalmente, hoje teremos mais um dia de "Eu indico...", que acontece todas as sextas-feiras. Anteriormente, tivemos Vozes femininas contemporâneas que todos deveriam conhecer. É claro que diversas cantoras incríveis não puderam participar da parada, embora merecessem, como Alicia Keys, Patty Ascher, Colbie Caillat, Amy Winehouse, Ana Cañas e tantas outras... Contudo, creio que estivessem bem representadas por aquelas que foram escolhidas... Por falar nisso, por acaso alguma delas passou a fazer parte da playlist de vocês? Eu espero que sim...

Já estas sete canções de hoje, certamente, já passaram um bom tempo em nossos antigos cds, fitas cassetes (alguém ainda se lembra disso?) ou mesmo nas rádios que escutávamos...Esses grupos musicais fizeram história, a minha história, ao menos. Aliás, se eu estiver me esquecendo de alguma, por favor, relembrem... Adoraria saber quais são as canções que vocês acham que marcaram a história.

Queria lembrar ainda que escolhi apenas músicas estrangeiras pela abrangência do tema, realmente, já que estas são canções que tocaram nas casas de pessoas em todos os quatro cantos do mundo. Contudo, não se preocupem, uma parada exclusivamente brasileira aparecerá por aqui em breve, ok?

Em nossa sétima posição, uma das melhores bandas dos anos oitenta, com um dos vocalistas mais charmosos de todos os tempos. Eles faziam rock - dos bons, por sinal - porém, suas canções realmente marcantes foram as românticas...Aliás, como não morrer de amores por Bon Jovi? Ele pode até continuar fazendo boa música, só que não há nada melhor do que suas baladinhas melódicas daquela época... Bom, aí vai uma das minhas preferidas, I'll be there for you .



Já em sexto lugar, temos uma das músicas mais tocadas também na década de 1980' , por sua melodia irresistivelmente divertida, além, é claro, da própria busca pela diversão. Estamos falando de Girls just want to have fun , de Cyndi Lauper... Não é preciso nem dizer que o lema que ela nos deixou de legado é muito bem utilizado até hoje, não é mesmo? Destaque especial para o modelito irreverente da Cyndi!


Vamos para a nossa quinta posição, diretamente dos anos 1970' ! A música dele é simplesmente uma das mais tocadas em trilhas sonoras, tem um astral maravilhoso e dá a maior vontade de sair cantando bem alto por aí. Estou falando do James Brown! E acho que todas já sabem qual é a canção a qual estou me referindo... I feeeeeel ... I feel goooooood! Tcha nananana... Já de cara dá pra lembrar do filme "O professor aloprado" e mais um moooonte! Então, sintam-se muuuuito bem ao som de I got you (I feel good)!


Nas posições anteriores, foram as músicas que fizeram história, de alguma forma. A partir de nosso quatro colocado, quem realmente fez história foram os artistas. Então, eu não poderia deixar de fora esse ícone da música, que foi Elvis Presley ... Minha gente, que voz que esse homem tinha, ou melhor, tem... Afinal, Elvis morreu ou não? Esta música que escolhi, dizem que foi escrita para a ex-esposa após o difícil divórcio que tiveram... Com vocês, Always on my mind .


Com a nossa medalha de bronze, uma das figuras mais polêmicas do cenário musical de todos os tempos. É dele o recorde de álbuns vendidos, é dele a idéia de fazer histórias em clipes musicais, é dele a dança mais copiada ao redor do mundo... Com sua morte aos 50 anos, movimentou uma legião de fãs, que prestaram homenagens durante vários meses... Para homenageá-lo, escolhi uma das minhas canções favoritas do rei do pop, Smooth Criminal.


Já que estamos tratando da realeza, a presença dela é imprescindível aqui. Ela lançou praticamente todas as tendências no cenários musical das cantoras pop, seus discos também possuem uma vendagem impressionante... Ela é polêmica em suas performances, e em tudo mais que se propõe a fazer... Sua discografia, aliás, é reflexo disto. Inclusive, eu poderia até mesmo fazer um Top 7 só com as músicas de Madonna... Porém, hoje, minha escolha para compor esta parada musical é Papa don't preach ... Espero que gostem!


E, encerrando nosso "Eu indico...", a primeira posição vai para outra figura bastante polêmica, antes, durante e após sua carreira com os Beatles. Estou falando de John Lennon, que tem uma das histórias mais excitantes e turbulentas do mundo musical. Minha escolha pode parecer até clichê, mas não consigo imaginar uma música que tenha feito mais história que Imagine ...


Vou ficando por aqui, minhas amigas, e espero que gostem da seleção de hoje!
Sexta-feira tem mais!

domingo, 18 de abril de 2010

Tenho fases, como a lua


Lua Adversa
(Cecília Meireles)

Tenho fases, como a lua
Fases de andar escondida,
fases de vir para a rua...
Perdição da minha vida!
Perdição da vida minha!
Tenho fases de ser tua,
tenho outras de ser sozinha.

Fases que vão e que vêm,
no secreto calendário
que um astrólogo arbitrário
inventou para meu uso.

E roda a melancolia
seu interminável fuso!
Não me encontro com ninguém
(tenho fases, como a lua...)
No dia de alguém ser meu
não é dia de eu ser sua...
E, quando chega esse dia,
o outro desapareceu...

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Terapia Toscana


Gurias, preciso passar outra dica!Sempre estou triste ou desanimada faço pipoca doce e assisto um filme que é super cliche, mas uma delicia de assistir: Sob o Sol da Toscana! Além de se passar na Itália, lugar dos meus sonhos, é super feminino, doce e cheio desses momentos fofos que quase nunca rolam na vida real. Pra mim, assistir filme ou ler um livro é uma verdadeira terapia: durante algum tempo você mergulha na vida e nos sentimentos de outras pessoas e se desliga um pouco do mundo real. O livro desse filme é maravilhoso, mas é um dos raros casos que eu gostei mais do filme. As paisagens são lindas e além disso tem um italiano gato no filme que só por isso ja valeria a pena! Quem não quer ser escritora, ter uma casa na Itália e namorar um italiano?

Esta velha angústia

Poema de Álvaro de Campos acompanhado da bela interpretação de Paulo Autran.

Esta velha angústia,
Esta angústia que trago há séculos em mim,
Transbordou da vasilha,
Em lágrimas, em grandes imaginações,
Em sonhos em estilo de pesadelo sem terror,
Em grandes emoções súbitas sem sentido nenhum.

Transbordou.
Mal sei como conduzir-me na vida
Com este mal-estar a fazer-me pregas na alma!
Se ao menos endoidecesse deveras!
Mas não: é este estar entre,
Este quase,
Este poder ser que...,
Isto.

Um internado num manicômio é, ao menos, alguém,
Eu sou um internado num manicômio sem manicômio.
Estou doido a frio,
Estou lúcido e louco,
Estou alheio a tudo e igual a todos:
Estou dormindo desperto com sonhos que são loucura
Porque não são sonhos.
Estou assim...

Pobre velha casa da minha infância perdida!
Quem te diria que eu me desacolhesse tanto!
Que é do teu menino? Está maluco.
Que é de quem dormia sossegado sob o teu teto provinciano?
Está maluco.
Quem de quem fui? Está maluco. Hoje é quem eu sou.

Se ao menos eu tivesse uma religião qualquer!
Por exemplo, por aquele manipanso
Que havia em casa, lá nessa, trazido de África.
Era feiíssimo, era grotesco,
Mas havia nele a divindade de tudo em que se crê.
Se eu pudesse crer num manipanso qualquer —
Júpiter, Jeová, a Humanidade —
Qualquer serviria,
Pois o que é tudo senão o que pensamos de tudo?

Estala, coração de vidro pintado!

Álvaro de Campos

quinta-feira, 15 de abril de 2010

O sétimo filho

"Eram esses os nossos lugares à mesa na hora das refeições, ou na hora dos sermões: o pai à cabeceira; à direita por ordem de idade, vinha o primeiro o Pedro, seguido de Rosa, Zuleika, e Huda; à sua esquerda, vinha mãe, em seguida eu, Ana, e Lula, o caçula." (L.A.)


Cena do filme "Lavoura Arcaica", direção de Luiz Fernando Carvalho e fotografia de Walter Carvalho.

"[sermão]O mundo das paixões é um mundo do desequilíbrio, é contra ele que devemos esticar o arame das nossas cercas, e com as farpas de tantas fiadas tecer um crivo estreito, e sobre este crivo emaranhar uma sebe viva, cerrada e pujante, que divida e proteja a luz calma e clara da nossa casa, que cubra e esconda dos nossos olhos as trevas que ardem do outro lado." (L.A.)


***


João Nassar e Chafika Cassis mudaram-se do sul do Líbano para o Brasil em 1920. Aqui, mais especificamente no interior de São Paulo, tornaram-se comerciantes e constituíram sua família. O sétimo dos dez filhos do casal é (ninguém mais, ninguém menos que) Raduan Nassar, autor da obra do mês do nosso Clube do Livro, Lavoura Arcaica.
Não costumo, em minhas análises, dar tanta ênfase à história de vida do autor, talvez pela tendência, ou pelo vício, da dialética construtivista, ou quem sabe por acreditar na independência da obra artístico-literária. Enfim, me explico por mudar essa prática neste caso.
Não revelarei os mistérios (sórdidos, sim, sórdidos!) de Lavoura Arcaica e de nosso 'herói' André, mas me atrevo a sugerir uma relação entre a vida do sétimo de João e a do quinto de Ióhana, Raduan e André, respectivamente.
Ambos foram criados sob os sermões tradicionais dos pais, sob o julgo da cultura árabe-libanesa. Posso falar com mais propriedade de André, de quem me aproximo e com quem me surpreendo a cada releitura... (é incrível o sentimento de perda, o vazio, o desconsolo! como se morresse alguém da família ao final de um livro que nos consome dessa forma)

Bradou Ióhana, o pai:

"Cale-se! Não vem desta fonte a nossa água, não vem destas trevas a nossa luz, não é a tua palavra soberba que vai demolir agora o que levou milênios para se construir; ninguém em nossa casa há de falar com presumida profundidade, mudando o lugar das palavras, embargando as ideias." (L.A.)

Raduan, na infância, sofreu com as crises epilépticas, com o preconceito e com o constrangimento a cada convulsão. Era obrigado pelos pais a frequentar a Igreja Católica e conservou-se beato até a adolescência, quando iniciou os estudos nas Faculdades de Filosofia, Literatura e Direito, na USP. Qual a relação disso com a vida de André? Descubram.

A meu ver, André foi desprivilegiado por não ter acesso a estudos como Raduan... mesmo assim possui uma mente inquieta, atormentada por ideias radicais diante da vida familiar que leva, além da insana e incontrolável paixão por Ana.

A biografia completa do autor vocês encontram aqui.

Obras do autor editadas em livros:

Lavoura arcaica (1975),

Um copo de cólera (novela de 1978) e

Menina a caminho (conto de 1994).


quarta-feira, 14 de abril de 2010

Blackbird, fly


"Blackbird singing in the dead of night
Take these broken wings and learn to fly
All your life...
You were only waiting for this moment to arise.

Blackbird singing in the dead of night
Take these sunken eyes and learn to see

All your life...
You were only waiting for this moment to be free.


Blackbird, fly..."



(Trechos da música Blackbird, dos Beatles)


Queridas literatas,
Gostaria de compartilhar com vocês, ocasionalmente, trechos de algumas composições da minha banda preferida! Assim, quem não costuma escutar Beatles, pode se interessar! A maioria das músicas é incrível! Recomendo de verdade!
Então, esse foi o post de estreia. De vez em quando, eu postarei aqui, entre outras coisas, trechos de músicas dos Fab Four !
Espero que todas gostem!
Abraços,

Minhas coisinhas pobres


Humildade

Senhor, fazei com que eu aceite
minha pobreza tal como sempre foi.
Que não sinta o que não tenho.
Não lamente o que podia ter
e se perdeu por caminhos errados
e nunca mais voltou.
Dai, Senhor, que minha humildade
seja como a chuva desejada
caindo mansa,
longa noite escura
numa terra sedenta
e num telhado velho.
Que eu possa agradecer a Vós,
minha cama estreita,
minhas coisinhas pobres,
minha casa de chão,
pedras e tábuas remontadas.
E ter sempre um feixe de lenha
debaixo do meu fogão de taipa,
e acender, eu mesma,
o fogo alegre da minha casa
na manhã de um novo dia que começa.”
Cora Coralina

Das utopias



Se as coisas são inatingíveis... ora!
não é motivo para não quere-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
a mágica presença das estrelas!

(Mario Quintana)

terça-feira, 13 de abril de 2010

Procurar bem


"Se procurar bem você acaba encontrando. Não a explicação (duvidosa) da vida, mas a poesia (inexplicável) da vida"
Drummond

Bom dia com poesia

Nada melhor do que um poema para acompanhar torradas com geleia e um capuccino quente nessa manhã fria de Brasília.

O impossível carinho

Escuta, eu não quero contar-te o meu desejo
Quero apenas contar-te a minha ternura
Ah se em troca de tanta felicidade que me dás
Eu te pudesse repor
- Eu soubesse repor -
No coração despedaçado
As mais puras alegrias de tua infância!

Manuel Bandeira

segunda-feira, 12 de abril de 2010

"É requinte de saciados testar a virtude da paciência com a fome de terceiros..."

"eu tinha de gritar em furor que a minha loucura era mais sábia que a sabedoria do pai, que a minha enfermidade me era mais conforme que a saúde da família, que os meus remédios não foram jamais inscritos nos compêndios, mas que existia uma outra medicina (a minha!), e que fora de mim eu não reconhecia qualquer ciência, e que era tudo só uma questão de perspectiva, e o que valia era o meu e só o meu ponto de vista, e que era um requinte de saciados testar a virtude da paciência com a fome de terceiros, e dizer tudo isso num acesso verbal, espasmódico, obsessivo, virando a mesa dos sermões num revertério, destruindo travas, ferrolhos e amarras, tirando não obstante o nível, atento ao prumo, erguendo um outro equilíbrio"



"Na modorra das tardes vadias na fazenda, era num sítio lá do bosque que eu escapava aos olhos apreensivos da família; amainava a febre dos meus pés na terra úmida, cobria meu corpo de folhas e, deitado à sombra, eu dormia na postura quieta de uma planta enferma vergada ao peso de um botão vermelho"


***


Saindo dos ares franceses, aristocráticos e requintados de Madame Bovary, e para ir entrando no clima do próximo mês, que terá como ápice o encontro dia dia 14/05, trago trechos de Lavoura Arcaica, de Raduan Nassar, nossa próxima inspiração!


Romantismo




Essa onda Madame Bovary me deixou super romântica. Ando com vontade de usar vestidos fofos, tomar vinho, morrer de amores, escutar musica chorosa, ver filmes de "mulherzinha". Aí, procurando inspirações para esse momento romântico, achei essa super dica que preciso divulgar! Olha que fofo e romântico é esse penteado!

Olhai os lírios do campo


"Precisamos dar um sentido humano às nossas construções. E, quando o amor ao dinheiro, ao sucesso nos estiver deixando cegos, saibamos fazer pausas para olhar os lírios do campo e as aves do céu."
Érico Veríssimo