sábado, 26 de junho de 2010

Samba de Breque


Conta meu tio que, depois de uma introdução dentro das regras, o rapaz entrou com um samba de breque que, cantado em voz respeitosamente baixa e ainda úmida de choro, dizia mais ou menos o seguinte:

Tava feliz

Tinha vindo do trabalho
E ainda tinha tomado
Uma privação de sentidos no boteco ao lado
Que bom que estava o carteado...
O dia ganho
E mais um extra pra família
Resolvi ir para casa
E gozar
A paz do lar
-- Não há maior maravilha!
Mal abro a porta
Dou com uma mesa na sala
A minha mulher sem fala
E no ambiente flores mil
E sobre a mesa
Todo vestido de anjinho
O Manduca meu filhinho
Tinha esticado o pernil.

Diz meu tio que, entre horrorizado e comovido com aquela ingênua e macabra celebração do filho morto, ouviu o amigo, a pipocar lágrimas dos olhos fixos no vácuo, rasgar o breque do samba em palhetadas duras:

— O meu filhinho
Já durinho
Geladinho!



Vinicius de Moraes

Trecho do conto "Samba de Breque".

Extraído do livro Para viver um grande amor, de 1980.

3 comentários:

  1. que coisa mais LINDA esta esse blog!!Lvei um susto de alegria HAHAHAHAHAHAH estamos bombando!!
    esse post esta perfeito!Vinicius, casa comigo??

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  2. Vinícius, quando você largar a Gabi, casa comigo?! haiaihaihaiai
    Lu fez um ótimo trabalho!

    PS: espero que tenham gostado da imagem inicial do blog!

    beijinhos,
    Dani

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  3. Adoreeei esse post, hahahaha, muito bom! "O meu filhinho, já durinho, geladinho!"

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