quinta-feira, 18 de abril de 2013

Os olhos, presos aos olhos celestes do anjo, umedeceram-se


  
    "Não trocaram uma única palavra. Ele a prendeu nos braços, encostando a face cálida na fria face de Tereza; o hálito do moço era perfume, perfume de tontear. Nos cabelos, na pele, nas mãos, na boca semi-aberta. O capitão fede a suor ardido, bafo de cachaça — homem macho não usa cheiro. Sem dela se afastar, Daniel levou as duas mãos ao rosto de Tereza, emoldurando-o nos dedos, e a fitá-la nos olhos veio com a boca semi-aberta e tomou de sua boca. Por que Tereza não desvia a cabeça se tem horror a beijos, nojo da boca do capitão sobre a sua, a sugar, a morder? Maior que o nojo era o medo. O moço, porém, não lhe faz medo; então, por que consente, não vira a cara, não o manda embora?
    A boca de Dan, os lábios, a língua, longa, suave carícia, a boca de Tereza foi se entregando. De repente, dentro de seu peito alguma coisa explodiu e os olhos, presos aos olhos celestes do anjo, umedeceram-se — pode-se chorar por outros motivos que não sejam dor de pancada, ódio impotente, medo incontido? Além dessas, existem outras coisas na vida? Não saberia dizer, só tinha comido da banda podre; peste, fome e guerra, a vida de Tereza Batista."

Tereza Batista cansada de guerra 
Jorge Amado

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