quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Carta à viuvinha.



"Se passasse há dez anos pela praia da Glória, minha prima, antes que as novas ruas que abriram tivessem dado um ar de cidade às lindas encostas do morro de Santa Teresa, veria de longe sorrir-lhe entre o arvoredo, na quebrada da montanha, uma casinha de quatro janelas com um pequeno jardim na frente. Ao cair da tarde, havia de descobrir na última, das janelas o vulto gracioso de uma menina que aí se conservava imóvel até seis horas, e que, retirando-se ligeiramente, vinha pela portinha do jardim encontrar-se com um moço que subia a ladeira e oferecer-lhe modestamente a fronte, onde ele pousava um beijo de amor tão casto que parecia antes um beijo de pai. Depois, com as mãos entrelaçadas, iam ambos sentar-se a um canto do jardim, onde a sombra era mais espessa, e aí conversavam baixinho um tempo esquecido; ouvia-se apenas o doce murmúrio das vozes, interrompidas por esses momentos de silêncio em que a alma emudece, por não achar no vocábulo humano outra linguagem que melhor a exprima. O arrulhar destes dois corações virgens durava até oito horas da noite, quando uma senhora de certa idade chegava a uma das janelas da casa, já então iluminada, e, debruçando-se um pouco, dizia com a voz doce e afável."


A viuvinha. JOSÉ DE ALENCAR. 

2 comentários:

  1. Não da vontade de pegar um bom café, botar uma roupa bem confortavel e ler esse livro???

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  2. José de Alencar é bom demais, né? Queria ler todas as obras dele.

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