segunda-feira, 21 de março de 2011

frágil e transparente


26 de Fevereiro de 1977, sábado

Admitamos que estou terrivelmente inquieta. Multiplico as coisas à minha volta para me securizar. Em vão. Tudo é excessivamente frágil e transparente. Alguém partindo de mim ajoelha sobre um véu diáfano colocado num solo sem solo, ou no ar, e espera. Tento ver mais longe, ou seja, num momento posterior, mas figura não se move, como se o tempo tivesse acabado; a figura inclina-se sobre o véu diáfano, toca com a cabeça o que está debaixo dela, o seu corpo repousa com a forma de um anel. Uma serpente aproxima-se, como o duplo desse corpo parado e investe sobre ele, mas apenas atinge o espaço circular vazio. A figura levanta-se, então, e cresce com aspecto de círio, de obelisco, ou chama. Uma voz pronuncia o seu nome, nome agudo que os meus ouvidos não atingem. Ao espaço em que agora habita o nada, a serpente regressa e ouve o nome. O som torna-se grinalda por cima da sua cabeça. Ataca com a língua voraz, mas as flores de Prunus Triloba Plena flutuam,
e recolhem-se
no lugar seguro da próxima Primavera.


Trecho do livro Um Arco Singular, Livro de Horas II, de Maria Gabriela Llansol.

3 comentários:

  1. Meeel!!! Que literata exemplar! hahaha

    Espero que seja um grande mergulho esse livro!! Tenho grandes expectativas!
    São muitas reflexões e crises interiores que ela discute de uma maneira única!

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  2. Dessas leituras que deixam a gente com o coração na boca!!

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