quinta-feira, 10 de março de 2011

Não quero piedade, quero amor


" Comprei este diário na semana passada na Lanterna de Diógenes. Era o único que existia na casa. Tipo álbum, fecho de metal, uma gaivota dourada na capa de plástico azul imitando couro. Ridículo!Senti necessidade de explciar à empregada da livraria que eu queria para dá-lo de presente a uma mocinha. Bom, não foi uma mentira completa. Porque na realidade dei o diário à jeunne fille que em parte ainda sou. Agora só falta o amor-perfeito seco entre duas páginas. Não, isso não se usa mais. Mas que é que se usa hoje em dia? Angústia. Tio Bicho fala no Angts de seus filósofos alemães. Minha angústia é menor. Angustiazinha nacional e municipal. Tem um mérito que é ao mesmo tempo um incoveniente. É minha. Em certos momentos, chegamosa ter até um certo orgulho de nossas tristezas e infelicidades, e usamos essas desgraças para comover os outros e arrancar deles piedade ou amor. (Não quero piedade, quero amor.) Em suma, uma chantagem. Um caso parecido com o da Palmira Pepé, que há anos anda pelas ruas da cidade manquejando, choramingando e mendigando. Quando os médicos querem curar-lhe o defeito da perna, a Palmira recusa, alegando que, se sarar, não terá mais razão para pedir esmolas.

Não quero usar o truque de Palmira. É por isso que vou desabafar neste livro. É mais decente lamber as próprias feridas na solidão, a portas fechadas. Mas o certo mesmo é curá-las."


Do diário de Sílvia, Érico Veríssimo.



4 comentários:

  1. Até semana que vem, Sílvia vai bombar por aqui!

    ResponderExcluir
  2. Gostei, parece ser um bom livro. Ah, e obrigada pelo comentário no meu blog.

    ResponderExcluir
  3. Finalmente consegui o livro. Começei a ler hoje! Ótima escolha, Gabi! Esse próximo encontro promete ser MARA!

    ResponderExcluir
  4. Ahh, eu tinha separado essa parte pra postar aqui no blog! hahaha Estou relendo! Gosto mais ainda pq começa no dia 24 de setembro, dia do meu aniversário!

    ResponderExcluir