"Sem
querer, pela primeira vez escapa-lhe da boca a expressão de um desejo, não
chega todavia a ser um pedido:
— Sempre
tive vontade de um dia andar na roda-gigante.
— Nunca
andou, Favo-de-Mel?
— Nunca
tive ocasião.
— Vai
andar hoje. Vamos.
Aguardam
a vez na fila, antes de ocuparem uma caçamba. Elevam-se pouco a pouco, enquanto
a roda vai parando para desembarcar os antigos e embarcar ps novos fregueses. O
coração palpitante, Tereza prende entre as suas a mão esquerda do doutor; com o
braço livre ele a circunda. Em determinado momento ficam parados no ponto mais
alto, a cidade lá embaixo. A multidão a divertir-se, confuso rumor de conversas
e risos, luzes multicores nas barracas, no carrossel, no contorno da praça.
Pouco adiante as ruas vazias, mal iluminadas, a massa de árvores do Parque
Triste, o vulto dos sobradões na sombra. Na distância, o murmúrio dos rios correndo
sobre as pedras para se juntarem no porto velho, a caminho do mar. Em cima, o
céu imenso de estrelas e a lua de Estância, desmedida, e louca. Tereza solta o
balão azul, o vento o leva no rumo do porto — quem sabe para o mar distante?
— Ai, que
maravilha! — murmura Tereza comovida.
Na
quermesse, obstinados, alguns basbaques, os olhos levantados, a espiá-los.
Também umas quantas senhoras e comadres arriscam destroncar o pescoço para
vê-los. O doutor traz o corpo de Tereza para junto de si, ela descansa a cabeça
no ombro dele. Emiliano acaricia-lhe os cabelos negros, toca-lhe a face e a
beija na boca, beijo longo, profundo e público — um escândalo, um descaramento,
uma delícia, um esplendor. Ah!, os felizardos."
TEREZA BATISTA
CANSADA DE GUERRA
JORGE AMADO
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