" - Precisa compreender, homem, que os tempos mudaram. - E, num tom quase colegial lendo um editorial de jornal, acrescentou: - É preciso reformar as velhas estruturas chamadas democráticas liberais. O Getúlio compreendeu a coisa. Somos um país subdesenvolvido de analfabetos e indolentes. É indispensável unificar e organizar a nação com punho de ferro. Vê o caso da Itália... O Mussolini acabou com a anarquia, implantando a ordem e o respeito à autoridade, e os tres já partem e chegam dentro do horário.
- Não sabia que tinhas aderido ao fascismo - sorriu Zózimo.
- Qual fascismo qual nada!Sou um realista e como tal simpatizo com os regimes autoritários. Sempre simpatizei, tu sabes.
- Mesmo not empo do doutor Borges de Medeiros?
- Ó homem, estamos na era do avião e do rádio e tu me vens com o borgismo!Naquela época eu era pouco mais que um rapazola inexperiente. E, se me meti na revolução de 23, foi só para seguir meu velho pai. Mas não desconverses. O Hitler reergueu a Alemanha, aboliu todos os partidos (menos o dele, naturalmente), botou pra fora do país os judeus, que, como se sabe, são os culpados dessas guerras e intrigas políticas e financeiras internacionais, homens gananciosos e sem pátria.
- Também não sabia que tinhas virado racista.
- Racista, eu? Ora, não sejas bobo. Sabes como trato a minha negrada. Eles me adoram. Mamei nos peitos duma negramina. Me criei no meio de moleques pretos retintos. Quando leio esses casos de ódio racional nos Estados Unidos, comento a coisa com a Lanja e lhe digo que no Brasil a gente, graças a Deus, não tem esses problemas, pois aqui o negro conhece o seu lugar".
Incidente em Antares, Érico Veríssimo.
Érico nasceu em 1905, no interior do Rio Grande do Sul, numa época em que os preconceitos raciais eram ainda predominantes. Apesar de tudo isso, soube como poucos autores de sua época, repudiar esse tipo de pensamento e expor em seus livros esses preconceitos horriveis. Um cara pra se orgulhar de ter na nossa literatura. Eu sou suspeita pra falar dele ne? hahaha
ResponderExcluirEu sempre quis ler esse livro, Gabi e é sem dúvida riquíssimo, pois tem muito da história do nosso país e é extremamente crítico... maravilhoso!
ResponderExcluirEle expõe o preconceito pelo olhar do preconceituoso (o que pra muitos pode parecer uma afirmação dessa visão), mas, dentro dela, há pequenas sutilezas que denunciam a atrocidade do que ele fala!
ResponderExcluirNossa, fiquei impressionadíssima com esse trecho! Com certeza, já deu pra perceber que o Érico é um dos tesouros mais preciosos da nossa literatura!
ResponderExcluirum romance histórico do realismo fantástico mto, mto fantástico!!
ResponderExcluiresse é um dos trechos que tenho grifado! um retrato genial da "tolerancia racial" do brasileiro!
meninas, leiam!!!